Segundo Wagner Costa Ribeiro, nós vamos ter que aprender a dimensionar a nossa estrutura de organização social a partir de momentos de falta de água e de excedência de água
Obra intitulada Uso da Água na Bacia do Prata busca debater as complexidades que envolvem as fronteiras e as águas transfronteiriças em relação às diferentes situações de gestão, governança, cooperação e conflitos gerados pela disputa dos usos dos recursos hídricos que a região possibilita.
O professor Wagner Costa Ribeiro, do Departamento de Geografia do Programa de Pós-Graduação em Geografia Humana e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (Procam) da Universidade de São Paulo, discorre sobre tópicos abordados no livro.
O colaborador explica que, em parceria com a professora Flávia Barbosa, alunos e ex-alunos, foram reunidos mais de dez anos de trabalho, que resultaram em nove capítulos abordando aspectos gerais da Bacia do Prata. “As pessoas precisam entender a importância da água, como ela tem um papel importante na organização social contemporânea. A educação pode ser um vetor importante, por meio dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), para difundir essa ideia e amenizar as tensões”, afirma.
Contexto
A Bacia do Prata é uma grande região hidrográfica da América do Sul, que se estende por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Essa extensão a coloca como a segunda maior bacia hidrográfica do continente, atrás apenas da Bacia Amazônica. O especialista comenta que o local envolve um passado histórico importante, desde a chegada dos europeus à América do Sul, que o utilizaram como eixo de penetração, criando problemas com as comunidades originárias. Ele complementa que, mesmo após a configuração dos Estados Nacionais Independentes, a região continuou sendo um foco de tensão, como a Guerra do Paraguai.
Mais recentemente, Ribeiro cita uma disputa entre Argentina e Uruguai, que se iniciou após a instalação de uma fábrica de papel na margem uruguaia e gerou preocupação dos argentinos — que se preocuparam com a contaminação das águas, pois afetaria o turismo no país. “Temos situações de tensões, envolvendo Brasil e Paraguai, em função da usina de Itaipu. Este ano completa o fim do primeiro ciclo do acordo de Brasil e Paraguai e, desde sempre, o Paraguai reivindica melhores preços na oferta de energia excedente, que por contrato fica com o Brasil, e pede por soberania energética.” O professor diz ainda que os paraguaios são obrigados a vender o excedente para o Brasil.
Mudanças climáticas
Ribeiro aponta que as mudanças climáticas afetam tudo o que se relaciona com a oferta de água. Por exemplo, é citada a crise de gestão da água que aconteceu na região metropolitana de São Paulo entre 2013 e 2015, pois influenciou na redução do volume de água ofertada na usina de Itaipu. Além disso, a alta vazão observada ultimamente na região das Cataratas do Iguaçu afeta a segurança da região, visto que propicia enchentes e o risco de rompimento da barragem.
“Talvez seja o nosso novo normal, nós vamos ter que aprender a dimensionar a nossa estrutura de organização social a partir de momentos de falta de água e de excedência de água, em volume diferente das médias que nós estamos acostumados a viver.” Ele alerta que os países não estão preparados para esses extremos.
O professor desenvolve que a região da Bacia do Prata é extremamente urbanizada, com um eixo industrial forte, que envolve desde o eixo Rio-São Paulo até Rosário, na Argentina. A bacia é importante para a localidade, pois proporciona água em abundância, insumo de produção energética, industrial e agrícola.
Soluções conjuntas entre países
Segundo o especialista, o Comitê Intergovernamental da Bacia do Prata, que envolve os países da região, é uma instituição anterior ao Tratado da Bacia do Prata e se dedica a pensar em formas de cooperação entre as governanças. Porém, ele afirma que não conseguiram configurar um corpo técnico próprio, com recursos estáveis e, dessa forma, vivem, em geral, com financiamento externo.
“Uma das conclusões importantes que o livro traz é a necessidade de fortalecer as instituições que já existem, dotando recursos para que se possa ter um corpo técnico independente que permita, por meio de um debate político e científico, construir relações mais duradouras que evitem situações de tensão.” Ele condena o fato de que desavenças entre países que fazem parte do Tratado do Prata sejam resolvidos pela Corte Internacional de Haia.
Por fim, Ribeiro cita o Programa das Nações para o Meio Ambiente da ONU, criado para analisar, discutir e prever conflitos gerados por recursos naturais. A demanda por água está em crescimento, por conta das diversas formas de utilização e das disputas fronteiriças, e isso gera muita tensão entre os países.
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